A sobrevida de Temer envergonha o Brasil

Votação que salvou Temer foi verdadeira peça teatral (Foto: Sérgio Lima)

Impopularidade do presidente vai se manter e a crise econômica vai persistir, mas ele ganhou fôlego para tocar a reforma da Previdência

Eduardo Militão

O presidente Michel Temer sobreviveu e ganhou uma segunda chance da Câmara dos Deputados para continuar governando o país. Sua impopularidade vai se manter e a crise econômica vai persistir, mas ele ganhou fôlego para tocar a reforma da Previdência. Para o líder do PT na Câmara, Carlos Zarattini (SP), o Planalto se enfraqueceu para aprovar as reformas. Mas, entre os governistas, a visão é que não se pode comparar a votação de proposta para investigar o presidente da República com a da reforma da Previdência. “Não existe relação. São discussões diferentes”, resume o líder do governo, André Moura (PSC-SE).  O ministro Moreira Franco vende otimismo: “Pela votação que tivemos [263 votos], falta pouco para chegar ao quorum constitucional [308 votos]”.

A polêmica votação — na quarta-feira (2/8)  — foi uma verdadeira peça teatral, como costuma ocorrer em votações que chamam a atenção da opinião pública. No país do real, os parlamentares da oposição jogaram para o alto uma nota de US$ 100 com a foto do presidente da República do Brasil com a palavra de ordem ‘Fora Temer Golpista’. Houve empurra-empurra. Deputados exaltados. E o deputado Wladimir Costa (PMDB-PA) fez do plenário um picadeiro. Ele começou a semana exibindo uma tatuagem no peito com a palavra “Temer”. Completou seu show na votação, com dois pixulecos, bonecos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com roupa de presidiário, nas mãos. Ele se colocou em frente à bancada do PT e batia um boneco contra o outro. Mas a confusão se instalou quando petista Paulo Teixeira (SP) partiu para cima de Costa e estourou um dos bonecos infláveis.

Durante a votação, muitos deputados diziam um “sim” favorável a Temer constrangido, em silêncio. Outros tentavam se explicar dizendo que Temer seria julgado ao final do mandato, em 2019. Bem diferente do que fizeram um ano atrás, quando, convictos, aprovavam o início da derrocada de Dilma Rousseff e do governo do PT. Outros se esconderam na hora de votar. Defenestrado da pasta da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB-PR) até apareceu no plenário, mas não votou.

Alguns petistas, como o ex-líder José Guimarães (CE), irmão de José Genoíno (SP), ao votarem, acrescentavam um patético “Diretas Já” – insustentável neste momento por razões políticas e práticas. Os aliados se divertiram com os tucanos. O relatório favorável a Temer foi elaborado por Paulo Abi-Ackel, do PSDB de Minas, e o líder do partido, o paulista Ricardo Trípoli, anunciou que a orientação era votar contra o presidente. Muitos peemedebistas, como o deputado Carlos Bezerra (MT), brincavam: “‘Sim’ ao relatório do deputado do PSDB”.

Os tucanos perderam o verniz e, divididos, pareciam um PMDB. Mesmo comandando quatro ministérios, 21 de seus 47 deputados votaram contra Temer. Os de São Paulo votaram para destronar Temer: foram 11 contra e 1 a favor de Temer.  Os de Minas para salvar o presidente: foram 6 a favor dele. O ex-presidente licenciado do partido, senador Aécio Neves, alvo de um pedido de prisão pela Procuradoria Geral da República, se empenhou para obter votos para blindar Temer. Outros, como o presidente em exercício, senador Tasso Jereissati (CE), queriam que o partido votasse unido e em sintonia com a opinião pública.

Um correligionário de Aécio, Paulo Abi-ackel, foi o autor do relatório na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para salvar Temer. O tucano e ministro da Secretaria de Governo, Antônio Imbassahy, articulou emendas parlamentares dentro do plenário. Enquanto isso, sintonizado como governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, o líder do partido, Ricardo Tripoli, encaminhou voto contra Temer e fez um discurso anticorrupção.

A oposição até que conseguiu algum feito. Com cerca de 100 parlamentares, arregimentou 227 votos. Mas nada suficiente para alcançar os 342 necessários para fazer a denúncia contra Temer seguir seu caminho natural no Supremo Tribunal Federal, afastá-lo do Palácio do Planalto, e abrir a porta para uma sucessão presidencial ainda antes das eleições de 2018. Mas o peemedebista mostrou força suficiente para sobreviver à acusação da PGR. Agora, só poderá ser processado a partir de 1º de janeiro de 2019, em alguma vara criminal do país, se isso acontecer mesmo.

Vitalidade

O presidente mostrou vitalidade. Na votação considerada a mais difícil e constrangedora, ele conseguiu 263 votos e o aval envergonhado de 23 que não votaram. Remando contra a opinião pública e parcela da elite da economia, Temer passou por esse teste de força. A ordem no Planalto é seguir em frente, como se nada tivesse ocorrido, e retomar a votação da reforma da Previdência, interrompida depois de sua aprovação na Comissão Especial, devido à revelação da delação dos empresários Wesley e Joesley Batista, da JBS.

O professor Carlos Melo, cientista político do Insper, classifica a vitória de Temer como importante. Para ele, a relevância da votação é que, de 17 de maio até hoje, quando se instalou a crise do chamado Friboigate, a gestão do peemedebista era dada como falida. Mas que ele terá agora de mostrar vitalidade e viabilizar a reforma da Previdência. Esse futuro é complexo. Se é verdade que não há relação entre esta votação e a da reforma, o secretário-geral do PSDB, deputado Silvio Torres (SP), avalia que 90% do PSDB vota a favor das mudanças previdenciárias, mas muitos nos outros partidos que votaram ao lado de Temer estão contra a reforma. E adverte: A aprovação depende da ambição da reforma. Ela precisa ser ajustada, enxugada.

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